Cada época alimenta os mitos que quer, as ilusões que precisa. E acalenta também os erros que constituem, um após outro, a moda bem-pensante das elites ou do vulgo.
Parecendo indiferentes às ilusões e às modas, os factos são o que são, mas na verdade deixam-se levar pela mão ou pela arreata, ora num sentido ora noutro. Não deixam de ser o que são, mas o seu rumo é-lhes imposto ou simplesmente consentido.
Hoje em dia acredita-se piamente que só há evolução social e material num sentido: o do progresso. E apesar de haver várias tendências que o puxam constantemente para direcções diversas e inconciliáveis, permanece a ideia algo confusa de que, quer a direcção seja uma ou outra, progresso sempre haverá.
Nada mais ilusório. Basta estudar a História para saber isso. As culturas podem retroceder ou sucumbir. Os valores e os costumes podem entrar em declínio. A prosperidade material pode decair. Até os impérios colapsam.
Mas hoje é politicamente incorrecto ensinar, por exemplo, que a civilização romana tenha sido destruída pelos bárbaros. Porque não há "bárbaros", há apenas povos com outros costumes, outras culturas; e, grosso modo, nenhuma civilização é superior às outras, sobretudo de um ponto de vista cívico e moral. Portanto, também não há "invasões bárbaras", há apenas movimentação de populações. E não há que comparar culturas, dizem-nos, porque as não há melhores nem piores, elas são apenas diferentes. Por isso temos que ser tolerantes, e pronto. Fim de conversa.
E se não for bem assim? E se algumas das sociedades avançadas de hoje estiverem a ser paulatinamente deglutidas por migrações "bárbaras" de povos subdesenvolvidos, que em vez de se integrarem nos padrões éticos e cívicos dominantes, dificilmente alcançados após um percurso de gerações ou séculos, apenas estejam a subvertê-los, a corroê-los e, nalguns casos, a erradicá-los? Que acontecerá enfim se as diferenças culturais não estiverem apenas a criar mais diversidade e colorido (mais cosmopolitismo, digamos) e sim a baixar a fasquia, os padrões, o nível dos valores aceites e dos costumes praticados?
Averiguemos pois, se queremos ser isentos. A delinquência e a criminalidade estão ou não a subir? E porquê? E por causa de quem? A confiança entre as pessoas está ou não a diminuir? E que razões há para isso? A insegurança geral é atribuída a quê? E a quem se aponta o dedo? Quais os aspectos em que o cidadão comum se queixa de que a sociedade andou para trás?
Se as conclusões de um tal inquérito, feito este com verdadeiro rigor e isenção, não forem exactamente aquelas que são dogmaticamente sustentadas, à revelia dos factos, pelas diversas modalidades intelectuais do "politicamente correcto", então acautelemo-nos: podemos estar à beira de um retrocesso cultural, talvez não no sentido intelectual do termo, mas sobretudo no sentido em que certos valores e padrões cívicos estão seriamente ameaçados.
Pergunta final: ainda há quem se preocupe com isso?