Se a reeleição dos deputados depende da sua posição nas listas, é natural que eles se preocupem sobretudo em agradar aos seus partidos. O contrário é que não seria de esperar. Mas quase toda a gente percebe que o desejável seria precisamente o contrário, isto é, que se preocupassem muito mais em agradar aos eleitores, dando expressão e suporte às suas necessidades, expectativas e anseios.
Argumenta-se que a culpa disto é do próprio sistema eleitoral, pois os eleitores têm muita dificuldade em saber quem são os deputados que os representam e, por isso, estão quase impossibilitados de os responsabilizar. Investindo contra moinhos de vento, há logo quem avance que a panaceia para esta maleita são os círculos uninominais, ou que se deveria enveredar por um sistema misto em que aqueles coexistissem com um círculo nacional, este último para compensar as distorções à proporcionalidade. Etc, etc, etc.
Cabe perguntar: enquanto persistir a disciplina de voto nos partidos políticos, adianta alguma coisa que os eleitores saibam quem é o deputado que representa o seu círculo? Terá esse deputado a capacidade de agir e votar pela sua cabeça, independentemente das instruções recebidas da sua direcção parlamentar, ou, no seu papel inconfessado de mero peão, fará basicamente o mesmo que faria qualquer outro no seu lugar, que é o mesmo que dizer, votará de acordo com as orientações que lhe derem, defenderá as posições que forem dominantes no aparelho partidário, mandará às urtigas as opções locais que forem inconvenientes para o seu partido como um todo? Afinal, o deputado conhecido irá pretender recompensa diferente daquela a que aspira o deputado desconhecido, a saber, a sua reeleição ou a ascensão na estrutura partidária, tendo em vista a continuação ou o "upgrade" das mordomias dos cargos políticos?
Segunda questão: se os círculos uninominais provocam distorções evidentes à proporcionalidade do sistema eleitoral, que maior democratização é que poderá resultar da formação de "maiorias artificiais" em que um maior número de eleitos não corresponde necessariamente a um maior número de eleitores apoiantes nem a uma maior representatividade política real?
A terceira questão já não é uma questão, é uma certeza. Um círculo nacional não compensa as distorções na representação proporcional criada pelos círculos uninominais, apenas a atenua. Porque um círculo nacional, apesar das manipulações a que pode ser sujeito, tende a gerar proporcionalidade, pois é também para isso que é concebido. Enquanto os círculos uninominais apenas tendem a gerar distorções a ela, apesar de serem concebidos para outra coisa completamente diferente.