terça-feira, 20 de setembro de 2005

Um círculo vicioso

Explicar à maioria dos cidadãos, e mesmo a muitos supostos especialistas em economia, que aumentar os impostos é uma decisão que faz subir a receita pública no imediato e tende a agravar o défice orçamental a médio prazo, não é tarefa fácil.
Se há défice, isso significa que o Estado precisa de mais receitas, de menos despesas ou de ambas as coisas. Se o défice é grande, não há que hesitar: precisa dessas duas terapias. Mas como diminuir despesas a curto prazo parece difícil, nem que seja pela razão simples de só ser possível com medidas drásticas e muito impopulares, a alternativa inteligente parece ser a de fazer os cortes possíveis nas despesas (entenda-se: os cortes politicamente menos inconvenientes) e agravar impostos directos ou indirectos para fazer aumentar as receitas. Há neste raciocínio dois pressupostos básicos que ninguém põe em discussão: aumentam-se os impostos e as receitas fiscais sobem; teoricamente, deverão até subir na mesma proporção. Como circunstância agravante, confunde-se ainda o aumento das receitas fiscais com o aumento das taxas de imposto, apesar de serem coisas diferentes (e de uma não conduzir necessariamente à outra).
Há aí um duplo erro. Primeiro, os aumentos de impostos constituem sempre um estímulo adicional para a evasão fiscal e têm como efeito indesejável um incremento da economia paralela; em consequência, a receita efectivamente gerada é sempre inferior à prevista pelos cálculos que não tenham em conta tal efeito. Segundo, é completamente menosprezado o impacto das sucessivas ondas de choque causadas pelo agravamento. Vejamos porquê.
Se um imposto, tal como o que recai sobre o valor acrescentado (IVA), é aumentado em 2%, parece à primeira vista que os cidadãos continuarão a pretender gastar o mesmo, mas o Estado arrecada mais 2% do que antes. Esquece-se, porém, que a subida dos impostos indirectos sobre os bens e serviços constitui um pequeno travão psicológico para certos tipos de consumo, que poderá levar muitos indivíduos e empresas a adiar algumas despesas não essenciais nem urgentes, esperando que uma posterior descida da carga fiscal reduza o desembolso necessário. Este freio actua sobretudo sobre a gama dos artigos caros ou de luxo, no caso dos indivíduos, ou sobre os investimentos arriscados ou adiáveis, no caso das empresas. As áreas mais atingidas representam normalmente transacções de valor elevado.
Mesmo que tal travão não funcionasse e toda a gente gastasse o mesmo, o valor total dos bens efectivamente adquiridos, subtraído o IVA, seria reduzido em 2% (exactamente a quantidade ou percentagem adicional do rendimento que vai ser engolida pelos impostos acrescidos). Como portanto a procura decai em quantidade, os efeitos desse decréscimo repercutem-se sucessivamente a montante, arrefecendo e contraindo a economia. Os efeitos não se sentem de imediato, mas rapidamente aparecem. Havendo menor quantidade de transacções, devido a esta contracção, e uma fuga de certa quantidade delas para a economia paralela, temos nada menos que dois fenómenos a actuar conjuntamente para reduzir a tributação prevista.